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Está tudo mudando! Que bom por isso!

Em 1963 Mr. Bob Dylan compunha a canção “The Times They Are a-Changin” um hino sobre mudanças com versos como este: “Venham mães e pais de todos os lugares/ E não critiquem o que vocês não conseguem entender/ Seus filhos e filhas estão além de seu comando/ Seu velho caminho está rapidamente envelhecendo/ Por favor saiam da frente se não puderem ajudar/ Pois os tempos estão mudando”. Esta canção escrita há 50 anos e hoje mais do que nunca parece transcender os limites do tempo, as mudanças desse início de século XXI acontecem a uma velocidade impressionante e para muitos parece ser difícil acompanhar e entende-las a ponto de negá-las enfurecidamente.


As novas tecnologias e a sua popularização trouxeram a possibilidade de grupos minoritários e oprimidos terem voz de uma forma que nunca tiveram antes e a insurgência de suas indignações em um sonoro basta na forma de vídeos e posts em redes sociais tem despertado no mínimo reflexões a respeito de temas antes tidos como tabus, graças a isso o debate vem sendo ampliado vindo à tona diversos temas como o machismo, racismo, homofobia, transfobia, segregação social, preconceito religioso, política e entre outros. Além do debate as chamadas minorias também conseguiram importantes conquistas de espaços sociais físicos e simbólicos, e é claro que a medida que os oprimidos ganham espaço, aqueles que se beneficiavam do silêncio de outrora agora começam a se sentirem ameaçados.


Se pudéssemos sintetizar o conjunto de pensamentos dominantes em nossa sociedade poderíamos representa-lo na figura de um homem de meia idade de classe média, branco, hétero e cristão. Esta figura teve em sua vida um conjunto de facilidades de aceitação diante das estruturas sociais por toda a sua vida e por isso mesmo tem tanta dificuldade de reconhecer no outro as dificuldades que ele nunca imaginou passar. Nunca enfrentou rejeição, piadinhas, violência verbal ou física, nos ambientes que frequentou desde a infância até a vida adulta, não teve que conviver com olhares de reprovação ou de repudio, nunca perdeu emprego por causa de sua aparência, sexualidade ou opção religiosa, e também nunca foi seguido de perto pelos seguranças em uma loja.


Agora imagine que esse padrão de detentor e formador de pensamento dominante vem se repetindo por séculos, se enraizando no subconsciente das pessoas formando o que chamamos de senso comum, naturalmente qualquer alteração ou promovida por uma agente diferente causará estranheza e incomodo ao padrão de pensamento dominante vigente. Por isso o homem machista se incomodará em ver a crescente presença de mulheres independentes em importantes postos de trabalho, o homofóbico se incomodará em ver um casal homoafetivo demonstrando afeto em público, o racista se incomodará em ver negros em universidades ou frequentando espaços que antes eram predominantemente frequentados por brancos, e o cristão se incomodará ao ver alguém de outra religião professando sua fé em público ou se incomodará com o ateu ao expressar sua falta de fé.


Aos acostumados a um mundo estático e concepções de mundo rígidas qualquer possibilidade de mudança é uma ameaça ao conforto e a segurança de um mundo de privilégios, para estas pessoas os agentes da mudança, os que professam a contradição, os que tocam nos assuntos que ninguém tem coragem são um incomodo, uma ameaça, causando uma tensão que via de regra resulta em um conflito, tanto no campo da dialética quanto material.


No campo dos discursos a retórica dos que desejam a manutenção do mundo tal como ele está se enveredam por dois caminhos. O primeiro a minimização da fala do outro, o que o outro tem a dizer é sempre insignificante, nunca é motivo suficiente para reclamar, ou protestar, utilizam a expressão “mi mi mi” para definir de forma pejorativa qualquer manifestação de alguma minoria. Outra expressão pejorativa utilizada por estas pessoas é a de “vítimismo” afirmando que todas as manifestações de qualquer minoria ocorrem porque “gostam de se fazer de vítimas”. Todas explicações simplistas e preconceituosas utilizadas para justificar a manutenção de ações opressoras.


O segundo caminho utilizado por estas pessoas no campo do discurso é a inversão do preconceito, ou como eles gostam de chamar o “preconceito reverso”, onde afirmam descaradamente que sofrem os mesmos preconceitos que as minorias sofrem. Chegam ao absurdo de afirmar que existe um “racismo reverso” onde os negros são racistas com os brancos, que existe uma “heterofobia” e que os homens e mulheres sofrem preconceito por serem héteros, e que existe uma “cristofobia” onde os cristãos são perseguidos por ateus ou praticantes de outras religiões e na minha opinião talvez o mais absurdo, afirmam que o feminismo é o machismo ao contrário! Seria engraçado se não fosse preocupante tamanha a falta de lógica destes argumentos e tamanha a desinformação a respeito das reais situações de violência e preconceito que estas minorias vivem no dia-a-dia.


No campo das ações os discursos se materializam nas mais diversas agressões físicas, a dificuldade de aceitar tais mudanças faz com que muitos partam para a destruição do diferente, não são raros os casos de assassinatos de mulheres, homossexuais, negros, periféricos, camponeses, entre outros simplesmente pelo fato de estes serem o que são e por ganharem espaço e visibilidade em um mundo que está acostumado a ignorá-los.


É preciso ficar claro que toda mudança estrutural de uma sociedade é conflituosa, e excessos são cometidos dos dois lados, porém é preciso discernimento para não confundirmos a reação do oprimido com a violência do opressor, e por mais que os privilegiados de outrora estejam agora se sentindo desconfortáveis, jamais poderão afirmar que sentem na pele em mesma proporção o que os oprimidos sofrem hoje e sofreram ao longo da história.


Por mais que possa incomodar a alguns o mundo está mudando, e aqueles que hoje estão ganhando voz não voltarão a ficar em silêncio, mesmo contra toda a violência física e simbólica desferida pelos saudosistas do retrocesso. E para concluir recorro a duas canções a primeira de Humberto Gessinger e a segunda de Bob Dylan: “A força não é capaz de parar uma ideia cujo tempo tenha chegado” (A Onda); “Seu velho caminho está rapidamente envelhecendo, por favor saiam da frente se não puderem ajudar, pois os tempos estão mudando” (The Times They Are a-Changin).


Boa Semana Meus Amigos!


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