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Sobre Moral e Tabu

Existem fatos que acontecem cotidianamente em nosso meio e, em decorrência desse fator, todos(as) sabem, mas, quando alguém procura estabelecer um diálogo sobre esse acontecimento, o fato deixa de ser fato e, passa para o patamar de tabu, considerado algo indizível, em virtude de infligir a moral e os bons costumes da sociedade. Por séculos, esse tabu esteve concentrado no tocante à assuntos relacionados ao sexo. As conversações familiares poderiam estar transcorrendo normalmente, mas, quando alguém por algum “deslize” mencionasse algo sobre sexo, as feições rapidamente se modificavam, pairando um silêncio perturbador no ambiente.



Depois de muita luta e consciência sobre a importância de se falar sobre sexo no seio familiar, o assunto gradativamente deixou de ser um tabu, no qual, no tempo presente, as pessoas conseguem estabelecer um importante diálogo nesse sentido, aprendendo de forma reciproca. A retirada prática do termo tabu, somente foi possível em virtude da diminuição da capa protetora moral sobre o sexo. Ou seja, quando a ética conseguiu suplantar os preceitos morais, como por exemplo, sexo só depois do casamento, para, se for fazer sexo, não esqueça a camisinha, os diálogos conseguiram romper barreiras intransponíveis, se tornando um clichê do e, no cotidiano.


Outro ação que está em nosso meio e, gradativamente vai conseguindo romper as barreiras da moralidade, principalmente no núcleo familiar, está diretamente relacionado com as drogas, ou melhor, com a maconha mais diretamente. Há uma importante campanha à favor da legalização da maconha, algo que compactuo, porém, o discurso moral, faz muitas pessoas confundirem legalização com liberação. Palavras que, guardadas as proporções se parecem, mas, seus significados são totalmente antagônicos.


A maconha como uso recreativo é uma prática corriqueira que, pertence não somente aos dias atuais. No entanto, mesmo diante de sua historicidade, o moralismo relutante em nos abandonar, impede à sua legalização. Assim como aconteceu com os diálogos sobre o sexo, a maconha somente conseguirá se efetivar como prática “legal” no país, à medida que a conversa familiar se tornar cada vez mais habitual, ética e, sem tabu, quando a compreensão científica sobre os efeitos da maconha no organismo, suplantar os equívocos moralistas e, quando as pessoas entenderem que, hoje milhares de usuários são presos ilegalmente, como se fossem traficantes.


A moral é um atuante setor defensivo e, muitas das vezes conforta muitas pessoas. Entretanto, as ações conseguem se entremear de alguma forma e, os defensores morais sabem da sua existência. Muitos(as) moralistas em seu íntimo, pensam de forma dicotômica da maioria dos seus pares, porém, para não transparecerem transgressivos perante esses, defende o que eles defendem e, atacam tantos outros que pensam de forma parecida com o seu eu subjetivo, porém, diferente do seu eu coletivo. Se não houvesse o receio acerca do que os outros vão pensar sobre o que eu penso, não tenho dúvida, a sociedade brasileira avançaria sobre muitos tabus.


Diante da crescente onda do conservadorismo, que nada mais é do que, o moralismo flutuando livremente, comercializado pelos ditos “cidadãos de bem”, provavelmente algumas conversações importantes, demorarão mais décadas para conseguirem retirarem a capa protetora da moral, tendo dificuldades para se entremear livremente no cotidiano. Entre os diálogos para ontem, destaco aqueles relacionados as questões de gênero, a necessidade de se discutir a legalização do aborto, a desmilitarização da Polícia Militar, a Reforma Agrária, a já mencionada legalização da maconha e, tantos outros diálogos que, se conseguissem se efetivar o quanto antes, fariam com que, o Brasil culturalmente alcançasse outro patamar social.


O mais preocupante da lei dos “bons costumes” está no fato de, a mesma intensificar sua agressividade nos menos favorecidos e vulneráveis socialmente. Não precisamos nos distanciar muito do teor desse diálogo para compreendermos os efeitos práticos do conservadorismo à moda brasileira. Quem são os usuários de maconha presos como se fossem traficantes? A maioria são jovens, negros e oriundos da periferia. Quem são as mulheres que morrem perante a prática do aborto? Geralmente são as mulheres pobres que, não tendo condições para pagar, recorrem as clínicas clandestinas. Quais são as pessoas mortas pelas ações recorrentes da Polícia Militar? Não são diferentes dos usuários presos como traficantes. Enfim, esses alguns exemplos notórios dos malefícios práticos da moral em nosso meio.


A moral resulta em decorrência da estagnação mental, porque, o indivíduo defensor desses preceitos, em tese, tem muitas dificuldades para reconhecer que a sociedade passa por constantes transformações e que, modelos utilizados para se pensar uma conjuntura à alguns séculos atrás, em sua grande maioria não se sustenta em outros contextos. Assim, no tocante a mentalidade, nossas ideias tem que estar sempre passando por um processo de um revisionismo, readaptação e contextualização. Se não fizermos isso, corremos o grande risco de estagnarmos. Em muitas situações, a estagnação está mais próxima do moralismo do que possamos imaginar.


Abraço e, boa semana para vocês.

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