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Discurso Hegemônico e Reforma da Previdência



Nessa semana, mais precisamente na quarta-feira, dia 20 de fevereiro, o presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, apresentou a esperada proposta da Reforma da Previdência. Proposta essa que vem sendo gestada, pelo sistema neoliberal, desde o governo Fernando Henrique Cardoso, passando pelos governos do PT, chegando com mais intensidade na gestão Temer, encontrando ancoradouro maior na, ainda alta, popularidade do atual presidente.


O grande representante dessa proposta de modificação da Previdência atende pelo nome de Paulo Guedes, considerado o superministro da Economia. Guedes está dentro de um patamar além do neoliberalismo, sendo, literalmente, um ultraliberal, fator que evidencia que suas propostas para a economia são mais destrutivas do que aquelas implementadas e idealizadas pelo governo Temer. É possível que, observando as últimas denúncias, o governo Bolsonaro venha a se fragilizar e gradativamente perca seu capital político, mas mesmo que isso ocorra não restam dúvidas que o Superministro da Economia permanecerá, porque para o mercado financeiro não importa qual figura está no poder, o importante é que essa figura possa atender os interesses do mercado.


Para isso, a grande mídia desempenha o papel fundamental, atuando no sentido de convencer as pessoas que quanto mais houver lucro para os detentores do poder, mais à sociedade terá condições de ter uma vida digna. Ou seja, há uma tentativa de vender um mercado financeiro humano no país, porém a realidade, para quem deseja ver, é totalmente diferente do que é veiculado pela grande imprensa, porque todas as medidas favoráveis ao mercado intensificaram, ainda mais, a vulnerabilidade social dos mais pobres, atingindo, também, a classe média.


Afinal, quais foram os benefícios que a PEC do teto dos gastos públicos trouxe para a sociedade? Procurando ser mais direto, nenhum. É importante observar o próprio poder do discurso, concomitante com suas implicações na prática, porque o que é considerado como gasto, como por exemplo, saúde, educação, cultura, lazer e outros, em um país tão desigual como é o Brasil, deve ser entendido como investimento. Os efeitos da PEC são nefastos, quando as pessoas que mais necessitam do estado encontraram de forma nua e crua a realidade do chamado estado mínimo.


Porém, em uma rápida pesquisa no Google é possível verificar como os grandes meios de comunicação, impressos, radiofônicos e televisivos, trataram a matéria, entendo-a como prioridade para “equilibrar” as contas públicas. Na maioria das situações é desumano acompanhar como os grandes meios, formadores de opinião, se relacionam com as questões econômicas no país, quando procuram desassociar a economia da vida prática das pessoas.


Outro ponto interessante para ser observado é a maneira como os grandes meios de comunicação lidaram com a denominada Reforma Trabalhista. Em uníssono, guardadas as raríssimas exceções, a grande imprensa procurou cristalizar no imaginário social a ideia de que a Reforma devolveria e, ao mesmo tempo, criaria novos empregos.


No final do ano de 2019 o projeto de lei completará dois anos de vigência e, até o presente momento, não conseguiu implementar aquilo que foi vendido, a saber, a já mencionada retomada do emprego, pelo contrário, o que tem se percebido é a consolidação da precarização do trabalho, aumento da informalidade, ausência de representatividade do/a trabalhador/a, concomitante com mais garantias legais para o empregador que não cumprir com suas obrigações constitucionais, em virtude de ter ficado muito mais dispendioso, economicamente/simbolicamente, para o/a trabalhador/a procurar seus direitos via justiça.


Na prática, a Reforma Trabalhista, assim como a Proposta de Emenda a Constituição da Contenção de Investimento, não trouxe benefícios para a maioria da população brasileira, que não somente padece dos mesmos problemas de ontem, como veem esses problemas serem intensificados a partir da consolidação das determinadas medidas.


Então, com o mesmo fito, o que está no cenário atual é a chamada Reforma da Previdência. O discurso para tentar convencer à população sobre a “importância” da reforma está alicerçado nos mesmos pilares dos assuntos tratados anteriormente, quando existe uma narrativa, praticamente, única de que a Reforma será importante porque diminuíra os privilégios, e garantirá um futuro mais digno para à sociedade. Esse discurso não parte apenas do governo federal, mas principalmente do capital financeiro, quando esse capital se constitui como o grande patrocinador dos maiores meios de comunicação no país. Diante disso, a grande imprensa endossa a narrativa do capital.


Nesse sentido, me valendo de Walter Benjamin, é fundamental pensar o papel da grande imprensa a contrapelo, procurando construir uma narrativa de contraponto, demonstrando para o conjunto social o quanto a denominada Reforma será prejudicial para a maioria, com especial atenção para os indivíduos mais vulneráveis. Além disso, o aspecto da demonstração está ancorado no anseio do diálogo coletivo, fomentando junto e com as pessoas a necessidade de lutar contra o desmonte do desejo de se construir um estado de bem estar social.


No Brasil, dominado pelos anseios do capital financeiro, é necessário demarcar território, se fazer presente em todas as frentes possíveis, conversar com os indivíduos do dia a dia, para que essas conversas tenham condições de se multiplicar. O contexto não é nenhum pouco favorável, mas se de um lado o aspecto sombrio é evidente, de outro o caos poderá proporcionar um (re)agrupar de forças da sociedade brasileira, algo já destacado pelo sociólogo Slavoj Zizek, fazendo com que essa sociedade, como já ocorreu inúmeras vezes na história do país, possa construir um presente/futuro de acordo com os seus desejos, com os seus anseios e com os seus sonhos.


Acreditar no protagonismo da sociedade é, assim como será, um desafio para o campo progressista, que terá que se desamarrar das suas concepções meramente representativas se quiser ter condições para barrar os retrocessos e propor alternativas de vida mais digna para as pessoas. Nesse âmbito, não será necessário apenas ficar na defensiva, como por exemplo no tocante a Reforma da Previdência, mas construir canais de diálogo para que uma parcela desassistida do estado, e de certa forma iludida com um projeto que já está se voltando contra ela mesma, possa entender que o caminho da mera representação não se sustenta para a construção do estado de bem estar social, mas que esse caminho passa pelo protagonismo dos próprios agentes sociais. Esse protagonismo tem um nome, a saber, movimentos sociais.


Se, dessa vez, o campo progressista não tiver condições de construir um canal para a tomada das ruas, estradas, praças e vielas, infelizmente todas as propostas de austeridade fiscal serão aprovadas, porque não haverá contraponto ao discurso hegemônico.


Em tese, a antítese nunca foi tão necessária como agora.

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