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Educação, o inimigo público número 1 do fascismo


Charge: Laerte

Infeliz o governante que elege como seu inimigo público número 1 a educação e, sem dúvida, infeliz a nação que apoia tal prática. O Brasil vive um crítico momento de profundo ódio pela educação e por seus porta-vozes, se materializando no corte de verbas, sucateamento e precarização das instituições públicas de ensino. Além disso, o conhecimento cientifico vem sendo constantemente atacado por uma massa, que prefere a violência e os saberes míticos populares. Configurando um engodo anti-intelectual na maior parte do país. Ao ponto do presidente, que não possui formação acadêmica, chamar os professores, mestres e doutores de todo o país, presentes na manifestação do dia 15 de maio de “idiotas úteis”.


A palavra “Idiota” tem origem grega e seu significado está relacionado a pessoa que não se envolve em política mesmo que a ela faça parte de sua vida. Ao ocupar as ruas e avenidas das mais diversas cidades por todo o país questionando um projeto de contingenciamento que comprometerá gravemente as instituições de ensino superior estes professores e alunos eram exatamente o oposto à palavra “idiota”, eram cidadãos conscientes e resistentes diante de uma decisão política verticalizada que os afetará diretamente.


O que temos presenciado é um ataque direto as instituições públicas de ensino superior com um contingenciamento de 30% das verbas de custeio de funcionamento, além de cortes nas bolsas de estudo da CAPES e CNPQ que afetam diretamente as pesquisas e a permanência de centenas de estudantes de cursos de pós-graduação. Em nível estadual os governadores de diversos estados inspirados nas ações federais também atacaram as instituições de ensino fundamental e médio, suspendendo direitos já conquistados no passado, como o RGA (Revisão Geral Anual) garantido pelo art. 37, X da Constituição Federal e o direito à licenças para pós-graduações e qualificação, além da redução de verbas para a contratação de pessoal e para a infraestrutura das escolas. Muitas escolas estaduais do Mato Grosso se encontram sem funcionários para as bibliotecas e salas de informática, além de um número reduzido de profissionais de limpeza.


Para a filósofa Marcia Tiburi o que presenciamos no Brasil é um “ódio que se dirige atualmente à inteligência, ao conhecimento, à ciência, ao esclarecimento, ao discernimento [...] um estranho ódio ao saber em sua forma crítica e desconstrutiva. Um ódio que se relaciona com a ameaça libertária do saber, um saber capaz de desmistificar, de contrastar certezas e de desvelar a ignorância que serve de base para todos os preconceitos.”[i] (2016). Esse ódio é vivenciado nas ruas por uma população que desconhece a realidade e o cotidiano das universidades do país e que ignora a importância do conhecimento científico e das pesquisas ali realizadas para o desenvolvimento tecnológico e social para o país, para essas pessoas a visão de um pulso firme e a violência seria a solução para todas os problemas sociais que vivenciamos, visão limitada e errônea que é ratificada por diversos representantes do governo federal.


A grande referência de intelectualidade do atual governo é o astrólogo Olavo de Carvalho (Não confunda com astrônomo, o astrólogo estuda os signos e o astrônomo estuda o espaço, os planetas...). Olavo mesmo sem ter um diploma de graduação se auto proclama “filósofo” e é o principal referencial teórico da família Bolsonaro, oferecendo conceitos errôneos e interpretações equivocadas a respeito de grandes autores e pensadores relevantes e internacionalmente reconhecidos.


Ignorar a importância do saber cientifico se tornou uma marca do governo de Bolsonaro como o a declaração feita pela Ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares Alves ao se afirmar Mestre em Educação e Direito[ii] mesmo sem possuir os respectivos diplomas. Damares tentou justificar seus títulos como um status atribuído aos seus estudos bíblicos, sendo desnecessário frequentar uma faculdade.


Além de propor o corte de recursos para as universidades o ministro da Educação, Abraham Weintraub também errou as contas ao tentar explicar de forma didática os cortes. Utilizando 100 bombons, o ministro afirmou que guardaria 3 e ½ para depois representando a quantia de 30%. (A questão é ele errou por não saber calcular ou errou de propósito para enganar uma população que a princípio não sabe calcular).


Bolsonaro também já propôs em sua conta no Twitter “descentralizar investimento em faculdades de filosofia e sociologia (humanas)”. Justificando que o objetivo é “focar em áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte, como: veterinária, engenharia e medicina.”[iii] Não por acaso, os cortes incidem diretamente nas disciplinas que contribuem para a formação do pensamento crítico e construção de uma sociedade politizada e atuante.


Não é de hoje que governos autoritários realizam ataques as instituições de ensino principalmente nas áreas de humanas buscando descredibilizá-las e sucateá-las em nome da urgência do mercado. Como fez o governador republicano Pat MacCrory na Carolina do Norte nos EUA em 2010. Não apenas sugeriu que alguns cursos fossem removidos do currículo público, mas também propôs que as universidades se concentrassem em uma educação baseada em habilidades que atendessem aos empregadores.


A perseguição aos cursos de humanas é uma prática recorrente em governos fascistas ao longo da história, por diversos ditadores sejam eles de direita ou de esquerda. Para o filósofo americano Jason Stanley os políticos fascistas visam os professores que consideram demasiadamente politizados taxando os negativamente como “doutrinadores marxistas”, expressão usada normalmente sem qualquer conexão com Marx ou com o Marxismo. A expressão é normalmente usada por políticos fascistas como forma de difamar discurso de igualdade social ou de gênero.


“Na política fascista, as universidades são degradadas em discursos públicos, e os acadêmicos são ignorados como fontes legítimas de conhecimento e expertise, sendo representados como “marxistas” ou feministas” radicais que estariam espalhando um plano ideológico esquerdista sob o disfarce de pesquisa. Ao rebaixar as instituições de ensino superior e empobrecer nosso vocabulário comum para discutir políticas, a política fascista reduz o debate a um conflito ideológico. Por meio dessas estratégias, a política fascista degrada os espaços de informação, obliterando a realidade.” (STANLEY, p. 62)


Stanley nos revela que o governo Nazista atacou os movimentos feministas acusando-os de ser uma conspiração judaica para destruir a fertilidade entre as mulheres arianas. Para os Nazistas na Alemanha as universidades subvertiam a masculinidade e ameaçavam as famílias tradicionais com os estudos de gênero. Outro exemplo deste ataque vem da Rússia de Vladimir Putin que exigiu que as universidades funcionassem como uma arma ideológica contra os “excessos” ocidentais do feminismo, atitude denunciada pela jornalista Masha Gessen revelando como as universidades russas atuaram na formação de estudos e politicas antifeministas e antigay. As universidades que se recusaram foram fechadas como a Universidade Europeia de São Petersburgo.

Para governos antidemocráticos a função da educação é produzir apenas cidadãos obedientes e treinados para o mercado de trabalho sem reclamar de suas condições precarizadas. O slogan nazista “O trabalho liberta” que foi estampado em diversos campos de concentração e de extermínio de judeus vem sendo fonte de inspiração também em nosso país por nossos governantes, como o lema de Michel Temer: “Não pense em crise, trabalhe” ou a fala do atual governador do Mato Grosso Mauro Mendes: “Não adianta espernear, tem que trabalhar”[iv]. Exemplificam bem o atual momento de nosso país.


O anti-intelectualismo é uma estratégia de poder de um governo que aposta na ignorância e nos preconceitos de seus eleitores para legitimar seus atos. Deturpam o saber científico e institucionalizado das universidades desacreditando-as para assim oferecer uma linguagem política reducionista e degradada, mascarando a realidade e substituindo-a por uma ilusão mítica.


A nossa voz, nossos textos e a nossa presença nas ruas são as nossas principais armas contra esse desmonte da educação pública no país. Os milhares de professores que ocuparam as ruas em protesto não estão fazendo balbúrdia como acusou o Ministro da Educação, e nem são vagabundos como gritam os cidadãos reacionários que ainda apoiam cegamente o governo, e muito menos “massa de manobra” como acusou o Presidente. Eles são os pensadores de nossa sociedade, produtores de ciência, conhecimento e questionamentos. E por fim, os intelectuais são a maior ameaça que existe a governos autoritários e incompetentes, e é exatamente por essa razão que são perseguidos.


Referências:


STANLEY, Jason. Como funciona o fascismo: A política do "nós" e "eles". Tradução Bruno Alexander. - 1ª ed. - Porto Alegre (RS): L&PM, 2018.

[i] https://revistacult.uol.com.br/home/50931-2/

[ii] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/01/sem-diploma-damares-ja-se-apresentou-como-mestre-em-educacao-e-direito.shtml

[iii] https://exame.abril.com.br/brasil/bolsonaro-sugere-reduzir-verba-para-cursos-de-filosofia-e-sociologia/

[iv] http://www.reportermt.com.br/direto-ao-ponto/mauro-nao-adianta-espernear-tem-que-acordar-para-a-realidade-e-trabalhar/92747

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1 Σχόλιο


santos.samaracaroline
22 Μαΐ 2019

Muito bom! São tempos sombrios. Ditadura em outra roupagem, mas algumas peças são semelhantes...

Estamos juntxs!

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