Um grupo de 26 pesquisadores de várias universidades brasileiras realizou, entre 2 e 12 de março de 2018, uma missão científica em Cuba, junto a pesquisadores do Centro de Desenvolvimento Local da Universidade de Granma (Bayamo - Cuba). Do conjunto, destaco a presença de professores da Universidade Estadual de Goiás (Câmpus Itapuranga, Iporá, Pires do Rio e Cora Coralina), da Universidade Federal de Goiás, dos Institutos Federais de Educação e Tecnologia de Goiás, membros da Associação dos Geógrafos Brasileiros (Seção Goiânia) e do Comitê Goiano de Direitos Humanos “Dom Tomás Balduíno”.
Nos 10 dias de peregrinação pelo território cubano, conhecemos algumas ações, programas e políticas públicas com ênfase no atendimento a grupos em estado de vulnerabilidade socioeconômica: camponeses, pessoas com deficiência, trabalhadores por conta própria etc. Experiências que nos evidenciaram dois componentes da realidade cubana: a primazia da pauta humanitária no modelo de desenvolvimento territorial adotado pelo Estado e as limitações técnico-produtivas impostas por uma economia deficitária, por sua vez resultante de uma posição – nada confortável – de Cuba no cenário geopolítico mundial.
Percorremos desde a capital, Havana, à porção leste da ilha, nos instalando por uma semana na cidade de Bayamo. Por todo o território, nossos sentidos foram desafiados por paisagens, sons, cheiros que remontam a duas grandes revoltas populares que marcaram a história de Cuba: a luta contra a colonização espanhola e a revolução de 1959, que resultou na derrubada do poder de um ditador (Batista) e na instauração do regime socialista. A memória da revolução está, assim, impregnada nas ruas, nos muros, nos monumentos, nas escolas, nas universidades, nos restaurantes, nos hospitais, nas hortas comunitárias, no corpo das pessoas.
O histórico de resistências impôs a Cuba algumas limitações. Estas são difíceis de serem compreendidas pelo turista desinformado. É preciso conhecer, entre outros fatores, os efeitos comerciais do embargo imposto pelos Estados Unidos da América após a derrocada da União Soviética: o comércio internacional fechara as portas para Cuba na compra de medicamentos para o tratamento do câncer infantil! Esta é apenas uma das retaliações sofridas pelo povo cubano pela resistência ao imperialismo norte-americano, e ilustra a perversidade da ética capitalista.
Às limitações, somam-se as insatisfações disseminadas, sobretudo, entre os jovens cubanos. Elas se explicam não apenas pela fragilidade econômica traduzida em racionamentos de produtos e serviços ao cubano, mas pela força do modo de subjetivação capitalístico.
As promessas da modernidade também chegam à ilha de Fidel Castro, como chegam ao sertão, às comunidades tradicionais no Brasil. Já a natureza estéril dessas promessas, ou seja, a impossibilidade de realização nos países periféricos, condição para a sobrevivência do capitalismo e garantia da qualidade de vida das sociedades ricas, é conteúdo que timidamente chega aos que sonham, um dia, fazer parte do sistema.
As conquistas no campo social – educação, saúde, alimentação e segurança públicas, reconhecidas internacionalmente – tranquilizam e mantém viva a esperança de cubanos (e destaco os pesquisadores que lá nos receberam) que, conhecedores da desumanidade e desumanização características das relações políticas e econômicas “globais”, ainda assim apoiam a abertura de Cuba à comunidade internacional. Além da defesa do público, garantindo o domínio do Estado em setores estratégicos, apostam na força dos princípios e valores que sustentaram a nação até agora: solidariedade, orgulho, consciência histórica, dignidade, honestidade, humanismo.
Despedi-me do território cubano contaminada pela mesma esperança.
Ana Carolina O. Marques
Doutora em Geografia. Professora no Curso de Geografia da Universidade Estadual de Goiás (Campus Itapuranga)
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