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Violência e (é) resistência


A preocupação de parte da sociedade brasileira com o tema da segurança, não somente é legítima, mas é necessária. Afinal, o país, comparado com outros, figura entre as primeiras posições quando o assunto está relacionado à violência. No entanto, em consonância com o protagonismo da ação em si, figura, também, os péssimos índices de fomento educacional para com a população.


Por mais que nos últimos anos o país tenha conseguido implementar políticas públicas que conseguiram diminuir o fosso que separa a maioria das pessoas de uma camada de privilegiados, os problemas ainda são significativos. Infelizmente, educação, no sentido mais amplo do termo, envolvendo conjunto social/estado, ainda não conseguiu reunir condições para implementar práticas que venham ao encontro da humanização.


A dificuldade para caminhar no sentido humanitário, explica, indubitavelmente, a sanha de parte da sociedade para com a ideia, distante de ser sábia, de colocar armas de fogo na mão das pessoas. Diante do cenário de irracionalidade, nessa semana, circulou em parte dos meios de comunicação, com destaque para os impressos, o resultado da pesquisa “Global Mortality From Firearms”, da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, no qual apontou a letalidade das armas de fogo no Brasil, colocando-nos na primeira posição.


De acordo com os dados da pesquisa, concentrada no ano de 2016, diante de 156 países observados, o Brasil figura na primeira posição com 42 mil pessoas mortas em decorrência de armas, seguido pelos Estados Unidos, contabilizando mais de 37 mil mortes. Perante um contexto que o tema da violência, conjuntamente com o crescente desejo de se armar, parece “roubar” a cena dos diálogos, a repercussão da pesquisa foi, infelizmente, mínima. Parece haver a naturalização, e não preocupação, de que morrer por arma de fogo é um processo sine quo non no país.


Pensa-se muito pouco sobre as causas do que entendemos por violência, quando se tateia superficialmente as possíveis soluções para o estágio final. A leitura equivocada para dirimir os problemas, assim como os mecanismos norteadores que constroem-no, estão diretamente relacionados com a educação, ou melhor, com a ausência dessa em nosso meio.


Diante da afirmação, as pessoas que recebem à culpa por praticarem atos de violência se encontram distantes de serem os verdadeiros protagonistas, sendo, na realidade, vítimas de uma distorção histórica. O protagonista prático da violência em nosso meio é a desigualdade social, que impossibilita que a maioria da população possa ter uma vida digna.


A desigualdade é a confluência de inúmeros fatores, como, por exemplo, ausência de enfrentamento para com os privilégios da elite dominante, dificuldade de implementar, verdadeiramente, uma reforma agrária, não taxação das grandes fortunas, recusa para ofertar moradia para os desabrigados, retirada de direitos trabalhistas, desestímulo à construção de espaços de lazer, repressão para com as manifestações culturais das minorias, e tantas outras distorções, fazendo com que a sociedade padeça diante da precarização.


Perante o cenário, alguns são obrigados a aceitar o estado de miséria social, porém outros se revoltam, e diante da violência produzida pela desigualdade, procuram responder com a mesma “moeda”, ou seja, praticam atos que, aos olhos de uma parcela significativa são consideradas ações de violência. No entanto, as ações têm um sentido filosófico, porque o que é compreendido por violência, é, na prática, atos de resistência e de indignação.


Reiterando, muitos são obrigados a aceitar a precarização, outros também são, mas se rebelam diante da ordem imposta, e perante o ato de transgressão procuram equilibrar, mesmo que pela força, as relações paritárias entre os sujeitos.


Compreender a precarização, a ausência do estado, e a desigualdade como meios propulsores da violência é fundamental, caso contrário, continuaremos, por muito tempo, carregando a “medalha” de ouro como o país mais letal do mundo. Porém, para compreender o sentido simbólico da violência, como ato de resistência/rebeldia, é necessário construir a educação humanitária, possível, de ser implementada, se houver a disposição de todos os agentes sociais.


Diante da dificuldade de compreender os nossos problemas históricos, o conservadorismo continuará conduzindo o jogo, fazendo com que muitos acreditem que serão super-heróis ao se defenderem do que entendem por “violência”. Porém, os postulantes à “heróis” não compreendem que também são vítimas de um sistema excludente, construtor de sujeitos conservadores, que irá jogar em suas costas a responsabilidade que deveria, ou melhor, tem que ser do estado e do conjunto social.


Talvez, em tempos sombrios, um dos caminhos necessários para descortinar o que somos, comece pelo questionamento, o que é, e quem gera a verdadeira violência?

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