
Espero
Que dessa vez os gatilhos não vençam.
Que as bocas emudecidas pelo medo sejam mais claras que um suspiro de agonia.
Se vivo, ainda, é pelos que não vivem.
Se respiro, ainda, é pelos que não respiram.
Se me movo, brigando com a inércia, é porque eu não esqueci,
Dos corpos, das flores, do oxigênio que deveria preencher pulmões.
Lembrar, lembrar, não normalizar o banal.
A saudade está latejando,
O preço foi alto, sem volta.
Forçada a me despedir,
Choro prematuro,
Luto, lutos.
Ainda assim, deixo doer,
Deixo arder,
Me alimento desse gosto amargo
Para não esquecer,
E não permito a decadência.
Meu grito é político
E espero que ele rompa os tímpanos,
Daquele que enterrou pedaços de nós,
sorrindo loucamente
Brincando de não respirar,
Enquanto eu me despedia,
Enquanto milhares concediam um adeus.
Espero,
Que a chacota não vença,
Que os boçais não se excedam,
Espero estômagos cheios, longe de almas vazias.
Que o deus da morte não esteja acima,
E os nossos corpos sejam maiores que alvos.
Escuto, o presságio do retorno
O sol se põe vermelho,
O amanhã,
Eu ainda espero.
Texto:
Jéssica Meireles
Historiadora. Mestre em Ciências Sociais e Humanidades.
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