top of page

Por que ler "O que é racismo estrutural?"


O advogado e filósofo Silvio Almeida, autor da obra O que é racismo estrutural, disserta na mesma sobre as consequências da escravidão no Brasil, abordando desde a concepção de raça, distinção entre racismo e preconceito racial, sua concepção individual e institucional, até a relação direta entre racismo e necropolítica, passando por marginalização social e a farsa da meritocracia. O autor apresenta o racismo em suas distintas formas, ao contrário do que é concebido pelo senso comum, o racismo não é apenas individual, sendo o mesmo apenas uma consequência do racismo como processo histórico. O racismo é, antes de qualquer outro adjetivo, estrutural. Como apontado pelo título, essa é a tese central da obra.

A leitura da produção de Silvio Almeida é imprescindível para a compreensão da formação nacional e do atual cenário brasileiro. O trecho mais marcante no desenrolar da leitura, em minha opinião, é justamente aquele em que o autor aborda a relação entre racismo e necropolítica, citando o “biopoder”, conceito utilizado por Foucault, para referir-se a um modo de exercício de poder sobre a vida. Sendo o Estado o principal provedor das condições de subsistência humana, essenciais para a manutenção da vida, a falta de apoio estatal, significa numerosas vezes, a morte, não se tratando apenas da morte biológica, como é destacado na obra, mas também da exposição ao risco da morte, a rejeição, a morte política. É nesse contexto que a relação entre o racismo e a necropolítica é desnudada, o racismo exerce um papel de divisor da sociedade, separando os considerados bons dos ruins, ou seja, as pessoas que merecem viver das que não merecem, sendo o preto, por sua inferioridade legitimada ideologicamente pelo racismo, colocado como alvo. A canção A carne, interpretada pela voz da célebre Elza Soares, afirma que “a carne mais barata do mercado é a carne negra”, infelizmente o trecho musical é verídico e condiz, progressivamente, com a realidade brasileira.


O racismo é uma ferramenta estatal, é errôneo pensá-lo apenas sob a perspectiva individualista, essa é uma das questões abordadas pelo autor. É fato que o racismo também se dá de forma individual, entretanto, a compreensão de seu caráter estrutural é contundente, pois é o que faz dele tão nocivo e necessário para a manutenção do processo de dominação/exploração capitalista.

No decorrer da leitura, lembrei-me de diversos nomes de pessoas pretas, que tiveram suas vidas roubadas. Quando os jornalistas Matheus Rodrigues e Henrique Coelho, publicaram no G1, no dia 6 de junho, que “pretos e pardos são 78% dos mortos em ações policiais no RJ em 2019” e que os “números mostram traços de racismo estrutural na segurança pública”, não se estava anunciando novidades a ninguém. O racismo estrutural/institucional continua alimentando nosso país, onde a necropolítica reina impune, quantas vidas pretas já foram roubadas, após a indagação comovente e dolorosa de Marielle Franco: “Quantos mais precisarão morrer?”, um dia antes de ser assassinada.


Neste momento em que se soma mais de 50.000 (cinquenta mil) mortes por COVID-19 no Brasil, se tem um genocida na presidência e há pressão política pela “normalização” da rotina comercial, imagine quem são os mais afetados pela pandemia, quem são os mais vulneráveis, os que padecem devido ao desamparo estatal, não há mais novidades, caro(a) leitor(a), apenas a realidade nua e crua da catástrofe brasileira.


Silvio Almeida nos oferece a oportunidade de compreender como o racismo estrutural se faz essencial para a perpetuação da dominação, abordando aspectos fundamentais do mesmo, ressaltando sua complexidade e magnitude, nos possibilitando a reflexão crítica sobre o tema, a identificação de suas características no meio social e o despertar do posicionamento antirracista, tão urgente quanto necessário.

Referência:

ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte (MG): Letramento, 2018.

72 visualizações

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page