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Sobre o Discurso de Honestidade



Nos últimos anos a palavra Honestidade tem frequentado intensamente o imaginário social, sendo deslocada de um valor tido e compreendido como comum, para ser “autoimpregnada” como se fosse pertencente somente a um determinado grupo específico, a saber, os denominados “cidadãos de bem”. O ressurgimento da categoria social está relacionada, diretamente, com às denúncias de corrupção que envolvem diferentes representantes políticos/sociais/econômicos/religiosos nos últimos tempos, como destaca Jessé Souza em seu mais recente livro, “Elite do Atraso”.


No entanto, entender que corrupção é algo endêmico no país passa distante dos olhares vigilantes da categoria mencionada acima, porque a categoria “acredita” que a corrupção está materializada em apenas um sujeito, fingindo não entender que atos corruptivos permeiam as mais diferentes ações do cotidiano.


O olhar tendo o conceito de endemia como valor de análise, demanda certa massa cefálica, assim como compreensão histórica, política, filosófica e social inerentes ao país. Em tese, compreender os dilemas da sociedade brasileira requer colocar as nádegas na cadeira e ler, mas ler muito. Porém, leitura é algo distante dos puritanos da honestidade, em virtude de preferirem construir os seus saberes por meio de vídeos, de preferência curtos, para não cansar demais. Assim estamos, no qual os defensores de uma certa honestidade se valem desse preceito para fomentar a cultura do ódio.


É possível imaginar que a vida de quem odeia deve ser muito deprimente. Porque no íntimo o sujeito entende que não possui a mínima condição para um diálogo honesto, e diante da leitura acerca da sua incapacidade, recorre a mais degradante das ações humanas, representada pelo desejo de destruição do outro. Páginas e mais páginas que circulam nas redes sociais representam, consideravelmente, a degradação humana que assola o país, como, por exemplo: “Fulano destrói jornalista X”, “Fulano é perguntado sobre tal questão e humilha beltrano”, entre outros exemplos. Os termos são com o mesmo teor, caminhando por meio da ameaça.


Tenho acompanhando alguns colegas procurando compreender o ressurgimento do fascismo no Brasil, no qual pautam suas análises por meio do medo histérico de parte da sociedade, quando, teoricamente, se sente desprotegida da violência social e anseia por um protetor. A análise em si tem sua relevância, no entanto está distante de adentrar nas profundidades da cultura do ódio que parece atingir vinte por cento (20%) da sociedade. O medo não é somente com a violência, está relacionado, também, com as inúmeras conquistas sociais dos últimos tempos, envolvendo garantia de direitos e condição socioeconômica.


O fato de a sociedade ter passado por transformações incomodou e continua incomodando aqueles/as que sempre viveram dos diferentes tipos de privilégios, e acreditou “experenciar” somente o padrão tradicional de sociedade. No entanto, quando viu as classes subalternas, me valendo do termo de Gramsci, romper com as barreiras excludentes, ameaçando o status quo, o grupo dos “honestos”, que é o mesmo dos “cidadãos de bem” entrou em desespero. Quando se está desesperado, qualquer discurso confortável que aplaque o sofrimento é aceitável.


É nessa esfera que adentra o presidenciável representante dos grupos mencionados, quando entendeu, não o sentimento do medo da violência, mas, o medo da perda de privilégios, e o fomento à cultura do ódio. O medo é de classe, e essa assertiva é muito fácil de ser percebida. Se desloque pelas ruas da cidade, irá perceber que são carros de uma parcela da elite dominante/local que circula com adesivos do presidenciável representante da cultura do ódio. Guardadas as raras exceções, mas é muito difícil perceber moto, carroça, ou bicicleta com adesivos.


Por que será? Pobre também não tem medo da violência social? É evidente que tem, mas pobre aprende a ser honesto desde a tenra idade, quando pais ou responsáveis dizem o famoso adágio popular: “Tem que ter brio na cara”. Brio é um conceito representativo de vergonha com relação aos atos praticados. Além do brio, passado de geração em geração, os pobres aprendem a compartilhar o pouco que tem, desde cedo. Os valores fulcrais, representa e explicam os motivos de o presidenciável da cultura do ódio não circular entre os preferidos dos mais pobres.


Por último, mas não menos importante, Honestidade não pode ser entendida como antítese de corrupção, mas como cortina inebriante para esconder os verdadeiros sentimentos de quem propala o conceito.

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