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Por que o amor incômoda?

Na semana passada, o SESC Pompéia, em São Paulo, promoveu o colóquio Os Fins da Democracia. O evento teve a participação da filósofa norte-americana, Judith Butlher, considerada uma das filósofas mais importantes dos Estados Unidos na contemporaneidade. Butlher tem uma longa trajetória intelectual, discutindo questões sobre democracia, autoritarismo, movimentos sociais, e principalmente análises sobre gênero e igualdade social.



A presença da filósofa no Brasil, em um contexto marcado pela retomada do conservadorismo, que se torna cada vez mais perceptível a olho nu, não passou distante dos “olhares” dos grupos conservadores, no qual fizeram desde petição online, à ataques físicos à filósofa durante o seu desembarque no Aeroporto, culminando em manifestações contrárias a sua presença na frente do SESC. Essas e outras ações pautaram as diretrizes de atuação desses grupos.


Interessante observar o teor conceitual das manifestações contrárias a presença de Butlher no Brasil, quando asseguram que a filósofa promove a denominada “ideologia de gênero”, assim como é destruidora das famílias mundo a fora, e por último, como justifica aos seus ataques, sejam físicos, como no caso da agressão, seja simbólico, no tocante a associação da pesquisadora com uma bruxa, os mencionados grupos defendiam, e continuam a defender suas ações em prol do que entendem por “manutenção dos valores da sociedade brasileira”.


Cabe à nós, perguntar que valores são esses? E outro detalhe não menos importante, esses grupos conservadores que atacam a comunidade LGBTQ, seja na presença de figuras conhecidas do grande público, como o caso da filósofa Judith Butler, ou do Deputado Federal Jean Wyllys, e de tantos anônimos espalhados nos mais diferentes rincões, de fato, representam a sociedade brasileira? Antes de responder a essas questões, gostaria de trazer uma experiência pessoal.


Desde quando entrei na Universidade, mais precisamente no Curso de História da UEG – Câmpus Itapuranga, me deparei com diálogos e com leituras que me fizeram compreender que existem outros brasis que, muitas das vezes, ao longo do processo histórico, nos negaram intencionalmente a possibilidade de ver. Se não o vemos, acreditamos “cegamente” em uma linearidade das relações sociais.


Não se enganem, os grupos conservadores que atacam de forma mais sorrateira as diferentes minorias no Brasil, não representam de forma alguma a sociedade brasileira, primeiro porque a representação ipsis litteris é impossível. A impossibilidade se justifica sem muitas delongas, sendo suficiente você sair à rua para perceber a diversidade sociocultural que molda o Brasil enquanto conjunto social. Assim, rapidamente já temos um importante parâmetro prático para evidenciar que, os que dizem representar o povo brasileiro, representam apenas uma pequena parcela da sociedade, que oprimiu e que continua oprimindo.


O segundo elemento se encontra relacionado com os “valores” que esses grupos defendem. Repetindo a pergunta feita anteriormente, que valores são esses? Segundo o enredo narrativo desses grupos, suas defesas estão centradas na “moral e nos bons costumes”. Quando partem desse seguinte argumento para defender suas condutas violentas, demonstram no mínimo um desconhecimento histórico, por acreditarem que os diálogos sobre gênero se fazem presentes apenas na contemporaneidade.


O conceito sobre diálogo é amplo, e se me permitem, gostaria de desloca-lo do campo teórico, trazendo-o para a prática. Assim, utilizarei as relações homoafetivas como um dos exemplos possíveis para se conversar sobre a temática. As relações homoafetivas não são um reflexo da contemporaneidade, como o conservadorismo imagina, porque o amor entre pessoas do mesmo sexo biológico acompanha a história humana. Para ter uma noção dessas relações, vocês podem consultar o importante livro A Homossexualidade na Grécia Antiga (1994) de autoria de Sir Kenneth Dover. No âmbito nacional, a presença da homoafetividade enquanto constatação de grande envergadura pode ser percebida desde o período colonial, no qual a historiadora Mary Del Priore possui importantes pesquisas.


Além dessas produções demonstrarem a historicidade das relações homossexuais, possibilitam também que percebamos o incômodo que diferentes formas de amor ocasionam em pessoas que acreditam que exista somente uma. Se os amores são históricos, as perseguições, a intolerância e o preconceito seguem a mesma linha. Assim, os valores defendidos pelos grupos que atacaram a presença de Judith Butlher no Brasil, são os valores do ódio, do rancor, do preconceito, do sexismo, e também da misoginia.


Mas por que tanto ódio? Historicamente esses grupos se beneficiaram, e se aproveitaram de uma estrutura de sociedade caracterizada na homogeneidade e no autoritarismo, e agora que percebem que há uma transformação sem volta em curso, se desesperam. O desespero é um claro indício de que estão perdendo território no campo das ideias, e como perdem, e muita das vezes lhe faltam ideias para contra argumentar, partem para a reação imediata, representada por meio da violência, seja ela física, ou em forma dos mais variados tipos de xingamento.


Porém, a truculência como forma de atuação, é inoperante diante do campo dialético, principalmente porque o diálogo circula no campo das ideias, e nesse limiar, a extrema direita demonstra ser inoperante. Do campo das ideias, o diálogo sobre gênero se materializará cada vez mais na prática, onde e quando, todas as formas de amor, não são somente serão válidas, mas necessárias para desconstruir o ódio dos moralistas de plantão.


Contra o preconceito, ame.


Abraço e boa semana para vocês!.

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